Os gritos soam no fundo do corredor, até que me levanto para tomar o café da manhã. Pão, dois ovos fritos, leite e um pedaço de bolo. Não necessitaria de mais nada o dia inteiro, mas como dizem que a primeira refeição é a mais importante, tendo a enfrentar outras no transcorrer da jornada.
O sol parece não querer sair, e os semáforos se fecham sempre que me aproximo deles. Seria coincidência ou tudo premeditado? Não me condeno ao errar e ser xingado por outro motorista, até porque desconheço seus problemas e seus descontentamentos. Por um instante acredito que ele nunca errou, e teria motivos para expressar tanta ira e nervosismo.
Vejo um homem, cabisbaixo e chorando no ponto de ônibus, mas meus afazeres impedem de parar. Fico imaginando o que faz uma pessoa largar tudo e se tornar um mendigo, um andarilho, o “des”conhecido “Zé Ninguém” que a nossa sociedade não consegue enxergar. Imediatamente surgem as respostas para me confortar.
Na minha mesa diversos documentos a serem analisados, mas minha vontade é tomar mais uma xícara de café, onde no caminho até a padaria vejo dezenas de pessoas desconhecidas, e alguns que se arriscam a me cumprimentar, respeitando uma certa distância. Ficar ao meu lado, muitas vezes, não parece ser viável, nem mesmo seguro, nos pensamentos da maioria. Compreensível, pelo menos aos fracos e débeis, onde também prefiro que haja este isolamento.
Retorno e enrolo até o horário do almoço, onde me servem um típico PF, com arroz, feijão, salada, batatas fritas, e bife, mesmo tendo sido orientado a evitar frituras. Fazendo um parêntese, eu nunca vi ninguém me chamar para comer salada, ou um caldo de ervilha. Os convites sempre envolvem pizzas, salgadinhos, churrascos e outras guloseimas que nunca são permitidos pelos médicos. Esses doutores vivem em qual planeta?
Depois do último gole de refrigerante, atendo alguns clientes com histórias absurdas, algumas fora do comum, que tenho que absorver e juntar com os meus próprios problemas, os quais não consigo resolver. Acho melhor procurar um advogado!
Nada acontece e as novidades nem sempre são favoráveis, quando num piscar de olhos o relógio na parede aponta 18 horas e 40 minutos.
Volto pra casa, tiro o “uniforme”, ligo o som, até que vejo o celular vibrar, com um convite especial indicando que daqui a diante nada mais fará parte deste cotidiano que insisto em passar. A rotina a partir de agora é cessada, ainda que seja por alguns instantes, até me deparar novamente com os problemas de amanhã.